A Justiça Eleitoral da 41ª Zona de Esperantina, representada pela Juíza Luciana Rocha Damasceno Cavalcante, indeferiu o pedido de registro de candidatura de Antônio Araújo dos Santos Filho ao cargo de Vereador nas Eleições de 2024 em Morro do Chapéu do Piauí. A decisão se baseou nas provas apresentadas no processo e na ausência de comprovação por parte do impugnado de fatos que pudessem afastar a inelegibilidade prevista na Lei Complementar nº 64/90. A Ação de Impugnação de Registro de Candidatura foi julgada procedente, resultando no indeferimento do registro.
VEJA A DECISÃO ABAIXO
Brasão da República
JUSTIÇA ELEITORAL
041ª ZONA ELEITORAL DE ESPERANTINA PI
REGISTRO DE CANDIDATURA (11532) Nº 0600112-44.2024.6.18.0041 / 041ª ZONA ELEITORAL DE ESPERANTINA PI
IMPUGNANTE: PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO PIAUÍ
IMPUGNADO: ANTONIO ARAUJO DOS SANTOS FILHO
INTERESSADO: COMISSAO PROVISORIA MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL DEMOCRATIVO MORRO DO CHAPEU DO PIAUI
Advogado do(a) IMPUGNADO: HORACIO LOPES MOUSINHO NEIVA – PI11969
SENTENÇA
Trata-se de pedido de registro de candidatura de ANTONIO ARAÚJO DOS SANTOS FILHO para concorrer ao cargo de Vereador, sob o número 55333, pelo PSD (55) no Município de MORRO DO CHAPÉU DO PIAUÍ.
Publicado o edital, o Ministério Público Eleitoral, tempestivamente, apresentou impugnação ao registro de candidatura (ID 122475755), com fundamento em suposta ausência de desincompatibilização de fato dos cargos públicos ocupados pelo candidato.
Intimado, o impugnado apresentou contestação (ID 122569481).
O impugnante apresentou réplica à contestação na petição de ID 122596032.
O Cartório juntou relatório de informações do candidato (ID 122517968), segundo o qual todos os documentos foram apresentados e não há necessidade de diligências.
É o relatório.
Decido.
De início, destaca-se que o pedido de registro do impugnado está de acordo com os requisitos estabelecidos nos arts. 24 e 27 da Res. TSE nº 23.609/2019 (ID 122517968), havendo regularidade da documentação acostada aos autos, cingindo-se a controvérsia da impugnação à ausência de afastamento de fato dos cargos públicos ocupados pelo impugnado (Secretário Municipal e Digitador – IDs 122437086 e 122569496).
Alega o impugnante que o impugnado se afastara de seus cargos apenas no plano jurídico (ID 122475755, fls. 04).
In casu, apesar da publicação da Portaria GAB nº: 041/2024 (anexo), que exonerou Antônio Araújo dos Santos Filho, do cargo em comissão de Secretário Municipal de Administração e Finanças, bem como da Portaria GAB nº: 103/2024 (anexo), que promoveu o seu afastamento formal do cargo efetivo de Digitador, há provas nos autos de que Antônio Araújo dos Santos Filho continuou comparecendo à sede da Prefeitura e praticando atos inerentes ao seu cargo de Secretário Municipal, conforme Notas de Empenho (em anexo) cujos valores foram destinados ao custeio de viagem a Teresina-PI, para tratar de assuntos de interesse da Secretaria Municipal de Administração, nos dias 29 e 30 de abril de 2024; para acompanhar o prefeito municipal junto ao escritório de assessoria jurídica, em Teresina/PI, no dia 02 de maio de 2024; assim como em 06 de maio de 2024, para acompanhar o prefeito municipal junto ao escritório de assessoria jurídica e assessoria planejamento e elaboração de projetos, em Teresina/PI, nos dias 13 e 14 de maio de 2024; e para participar de reunião sobre a relevância do papel das instancias de governança na política pública de turismo, em Batalha/PI, no dia 27 de junho de 2024 (link:https://transparencia.morrodochapeu.pi.gov.br/morrodochapeu/empenho/detalhe cod=56436&codUnidade=20300&ano=2024).(Grifo nosso)
Acrescenta o impugnante que em sede de procedimento administrativo constatou-se, in loco, a presença do impugnado na sede da Prefeitura Municipal(ID 122475755, fls. 06).
Prontamente, no âmbito da Notícia de Fato Eleitoral, foi determinado ao Oficial de Promotoria que se dirigisse à sede da Prefeitura Municipal, em horário de expediente ao público, havendo Oficial da PJ certificado a presença de Antônio Araújo dos Santos Filho no gabinete do prefeito de Morro do Chapéu, em pleno DIA 09/08/2024, ÀS 09:30 HRS. (certidão em anexo). Pergunta-se: o que fazia o impugnado na Prefeitura Municipal, especialmente no Gabinete do Prefeito Municipal, já que está afastado dos cargos de secretário municipal e de digitador?
Houve, ainda, uma contradição aviltante entre os próprios servidores do órgão, tendo em vista que uma servidora chamada “Diene” informou que o cargo de secretário municipal de administração estava “vago”. Em seguida, outra servidora informou que a própria Diene era a nova secretária. Disto, ao ser indagada se havia ciência do exercício da função de secretária, Diene respondeu que “funcionários não sabiam de nada não”. (Grifo nosso)
Arremata o impugnante (ID 122475755, fls. 07) afirmando que “ … é possível concluir que houve apenas a desincompatibilização formal – através da exoneração (cargo de secretário municipal) e do afastamento (cargo de digitador) – todavia, no cotidiano o impugnado permanece a praticar os atos e tarefas dos quais o deveria ter se afastado de fato, exercendo plenamente sua influência política para desequilibrar o pleito eleitoral de 2024”.
Acostados à inicial, juntou o impugnante:
i- comprovante de empenho de diárias(ID 122476072 ) em favor do impugnado nos dias 29 e 30/04/2024, cuja descrição da finalidade é “VALOR QUE SE EMPENHA PARA COBRIR DESPESA COM 02 (DUAS) DIÁRIAS, CONCEDIDA AO SECRETARIO MUNICIPAL DE ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS, PARA CUSTEIO DE VIAGEM A TERESINA-PI, PARA TRATAR DE ASSUNTOS DE INTERESSE DESTA SECRETARIA, JUNTO A ASSESSORIA JURÍDICA E ELABORAÇÃO DE PROJETOS VERMELHA CONSULTORIA, NOS DIAS 29 E 30 DE ABRIL DE 2024”;
ii- comprovante de empenho de diária(ID 122476076) em favor do impugnado no dia 02/05/2024, cuja descrição da finalidade é “VALOR QUE SE EMPENHA PARA COBRIR DESPESA COM 01 (UMA) DIÁRIA, CONCEDIDA AO DIGITADOR, PARA CUSTEIO DE VIAGEM A TERESINA-PI, PARA ACOMPANHAR O PREFEITO MUNICIPAL JUNTO AO ESCRITÓRIO DE ASSESSORIA JURÍDICA, NO DIA 02 DE MAIO DE 2024”;
iii- comprovante de empenho de diária(ID 122476079) em favor do impugnado no dia 06/05/2024, cuja descrição da finalidade “VALOR QUE SE EMPENHA PARA COBRIR DESPESA COM 01 (UMA) DIÁRIA, CONCEDIDA AO DIGITADOR, PARA CUSTEIO DE VIAGEM A TERESINA-PI, PARA ACOMPANHAR O PREFEITO MUNICIPAL JUNTO AO ESCRITÓRIO DE ASSESSORIA PLANEJAMENTO E ELABORAÇÃO DE PROJETOS, NO DIA 06 DE MAIO DE 2024”;
iv- comprovante de empenho de diária(ID 122476080) em favor do impugnado nos dias 13 e 14/05/2024, cuja descrição da finalidade é “ VALOR QUE SE EMPENHA PARA COBRIR DESPESA COM 02 (DUAS) DIÁRIAS, CONCEDIDA AO DIGITADOR, PARA CUSTEIO DE VIAGEM A TERESINA-PI, PARA ACOMPANHAR O PREFEITO MUNICIPAL JUNTO AO ESCRITÓRIO DE ASSESSORIA JURÍDICA E ASSESSORIA PLANEJAMENTO E ELABORAÇÃO DE PROJETOS, NOS DIAS 13 E 14 DE MAIO DE 2024”;
v- comprovante de empenho de diária(ID 122476083) em favor do impugnado no dia 27/06/2024, cuja descrição da finalidade é “ VALOR QUE SE EMPENHA PARA COBRIR DESPESA COM 01 (UMA) DIÁRIA, CONCEDIDA AO DIGITADOR, PARA CUSTEIO DE VIAGEM A BATALHA-PI, PARA PARTICIPAR DE REUNIÃO SOBRE A RELEVÂNCIA DO PAPEL DAS INSTANCIAS DE GOVERNANÇA NA POLITICA PUBLICA DE TURISMO, NO DIA 27 DE JUNHO DE 2024”;
vi- certidão de servidor da Promotoria( ID 122476070) informando a realização de diligência em 09/08/2024 na sede da Prefeitura Municipal de Morro do Chapéu do Piauí, na qual constatou a presença do impugnado no gabinete do prefeito;
Em sede de contestação(ID 122569481), o impugnado alega que foram observados os prazos legais de afastamentos dos cargos públicos e que o recebimento de diárias ocorreu na condição de servidor efetivo(digitador).
As reuniões/eventos que o candidato teria supostamente participado na condição de digitador, em alguns casos acompanhando o prefeito em reuniões de natureza administrativa, também não configuram a prática de atos típicos do cargo de Secretário Municipal de Administração.
É comum e legal que servidores ocupantes de cargos efetivos, como é o caso do candidato, sejam designados para acompanhar e/ou assessorar a administração municipal em determinadas funções específicas, sem que isso importe na continuidade do exercício de um cargo do qual já se tenha desincompatibilizado. ( Grifo nosso)
Sustenta o impugnado a existência de erro material na confecção do empenho de ID 122476072 e que a viagem objeto do referido empenho ocorreu na condição de digitador. Para corroborar a existência de erro, cita o Decreto Municipal nº 005/2021 (ID 122569486,fls. 05) o qual fixa o valor da diária para Secretários Municipais em R$ 300,00 e para os servidores em geral em R$ 150,00.
Todas as diárias mencionadas nos autos referem-se exclusivamente ao exercício do cargo efetivo de DIGITADOR ocupado pelo candidato, cargo este do qual sua desincompatibilização foi formalmente realizada em 01/07/2024, em estrita observância ao prazo legal de três meses antes das eleições, conforme preconiza a legislação eleitoral.
…
A presença do candidato em atividades na prefeitura, em momentos isolados, não pode ser interpretada como exercício continuado das funções de Secretário. A jurisprudência eleitoral é clara ao afirmar que, para se configurar a inelegibilidade por ausência de desincompatibilização, deve haver prova inequívoca de que o candidato continuou a exercer, de fato, as funções do cargo após o prazo legal.
…
No caso em tela, não há qualquer evidência material de que o candidato tenha participado de atos de gestão ou tomado decisões administrativas após a sua exoneração do cargo de Secretário Municipal.( ID 12256948, fls. 07 e 08). ( Grifos nossos)
Intimado para apresentar réplica (ID 122596032), o impugnante reiterou os argumentos da inicial e pugnou pelo indeferimento da candidatura do impugnado.
Por expresso mandamento constitucional (art. 14, §9º), a Lei Complementar nº 64/90 passou a exigir o afastamento do exercício do cargo público por quem o ocupe para concorrer a cargo eletivo, estipulando prazos a serem observados de acordo com natureza do cargo ocupado, entre os quais o cargo de Secretário Municipal.
Da leitura da Lei nº 64/90, verifica-se que quem ocupa o cargo de Secretário Municipal deve afastar-se do cargo até 06 meses da data da eleição.
Art. 1º São inelegíveis:
…
VII – para a Câmara Municipal:
a) no que lhes for aplicável, por identidade de situações, os inelegíveis para o Senado Federal e para a Câmara dos Deputados, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização;
b) em cada Município, os inelegíveis para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização .
O instituto da desincompatibilização busca dar concretude à legitimidade do pleito eleitoral(art. 14, §9º, CF/88), assegurando-se aos(as) candidatos(as) uma igualdade material ao se evitar o uso do cargo público por quem o detenha. É a lição de José Jairo Gomes.
A finalidade desse instituto é evitar o quanto possível que candidatos ocupantes de cargos públicos coloquem-nos a serviço de suas candidaturas, comprometendo não apenas os desígnios da Administração Pública, no que concerne aos serviços que devem ser prestados com eficiência à população como também o equilíbrio e a legitimidade da eleição(Direito Eleitoral, 15ª ed., pág. 238, 2019).
A ausência de desincompatibilização, quando exigida, tem como consequência a incidência de uma causa inelegibilidade, qualificada na CF/88 ou na Lei nº 64/90. Para além de um afastamento meramente formal do cargo público, a desincompatibilização só afasta a inelegibilidade quando ocorrer de fato, já que é esta e não aquela que assegura legitimidade das eleições tutelada pela Constituição.
Nesse contexto, a observância do procedimento legal que regula as eleições é essencial para a legitimidade dos governantes. Tal procedimento deve desenvolver-se de forma normal, i.e, em harmonia como regime jurídico do processo eleitoral. Ademais, deve ensejar que todos os participantes tenham ampla liberdade de expressão e gozem das mesmas oportunidades de se apresentar ao eleitorado e divulgar suas ideias e projetos. Legítimas e normais, portanto, são as eleições em que houve a observância do arcabouço jurídico-normativo inerente ao processo eleitoral(Direito Eleitoral, 15ª ed., pág. 77, 2019). ( Grifo nosso)
O Tribunal Superior Eleitoral possui entendimento pacífico nesse sentido.
“Eleições 2020 […] Registro de candidatura. Indeferimento na origem. Vereadora. Desincompatibilização. Art. 1º, IV, a, c/c o III, b, 4, da Lei Complementar nº 64/1990. Afastamento do cargo de secretária municipal de habitação e planejamento. Posse subsequente no cargo de diretora–geral na mesma secretaria. Aparência de desincompatibilização. […] Ônus da candidata em demonstrar que houve a desincompatibilização, de fato e de direito. Acórdão em harmonia com o entendimento da corte superior […] 3. A jurisprudência deste Tribunal Superior amiúde analisa hipóteses concretas nas quais há desincompatibilização formal de cargos e funções públicas, em relação a todos os vínculos jurídicos com a Administração Pública, mas há permanência na prática dos atos e tarefas dos quais o candidato deveria afastar–se. Trata–se de hipótese de ausência de desincompatibilização de fato. 4. O fenômeno da desincompatibilização de fato tem como premissa o efetivo afastamento do candidato de suas funções regulares, para além do desligamento operado exclusivamente no plano formal. 5. Na espécie, a candidata se desincompatibilizou do cargo de Secretária Municipal de Habitação e Planejamento e assumiu, ato contínuo, o cargo de Diretora–Geral da mesma secretaria, mantendo–se no núcleo de poder e nas atribuições das quais deveria ter–se afastado. 6. Essa condição impõe à candidata o ônus de demonstrar a inexistência de burla material ao instituto da desincompatibilização. 7. Inexistência de desincompatibilização no prazo exigido pelo art. 1º, IV, a, c/c o III, b, 4, da Lei Complementar nº 64/1990 […]”.(Ac. de 23.9.2021 no AgR-REspEl nº 060038135, rel. Min. Edson Fachin.)( Grifo nosso)
Também o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul já decidiu de forma semelhante:
REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO ESTADUAL. IMPUGNAÇÃO. PARTIDO POLÍTICO. PRELIMINAR. PERDA DE OBJETO. AFASTADA. MÉRITO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO DE FATO. INOCORRÊNCIA. PARTICIPAÇÃO EFETIVA NA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. INCIDÊNCIA DA INELEGIBILIDADE PREVISTA NO ART. 1º, INC. III, AL. B, N. 4, C/C O INC. V, AL. B, E INC. VI, DA LEI COMPLR N. 64/90. PROCEDENTE. INDEFERIMENTO DO REGISTRO. 1. Pedido de registro de candidatura ao cargo de deputado estadual. Impugnação oferecida por partido político, ao argumento de que o pretenso candidato se enquadra na hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. III, al. b, n. 4, c/c o inc. V, al. b, e inc. VI, todos da Lei Complementar n. 64/90. 2. Preliminar de perda de objeto afastada em razão de que os argumentos trazidos não esvaziam a razão da presente demanda; ao contrário, o compõem. São exatamente esses fatos que, valorados, integrarão a análise do Poder Judiciário após o exercício do contraditório entre as partes. 3. Incontroversa as exonerações do impugnado dentro do prazo de desincompatibilização. A de Secretário de Orçamento e Finanças, em 31.3.2022, e a do cargo de Assessor da bancada de Partido Político na Assembleia Legislativa, em 30.6.2022. 4. Desincompatibilização de fato não ocorrida. Atuação do impugnado como secretário municipal, quer exercendo o poder no seio daquele Poder Executivo, quer perante a comunidade. 4.1. Fotografia em que é retratado momento cerimonioso dentro das dependências do gabinete da Prefeitura, estando os participantes perfilados em posição solene, formal. Nítido exercício de fato do cargo de Secretário de Orçamento e Finanças de parte do impugnado, onze dias após ter sido formalmente exonerado, pois indiscutivelmente atuou exercendo o cargo na reunião, compondo equipe de representação para interlocução com outro município. 4.2. Troca de mensagens, via aplicativo, entre a Prefeita e o Secretário de Obras, ocorrida quase vinte dias após a exoneração do impugnado, em que se verifica a sua nítida participação em assunto interno do Poder Executivo Municipal. Provas contundentes, não rechaçadas pelo impugnado. 5. O cargo de secretário municipal integra o rol de agentes políticos – e por isso há a previsão de desincompatibilização no prazo mais extenso previsto em lei, exatamente para que o ocupante, pretenso candidato, (1) afaste–se do círculo decisório da gestão do Poder Executivo, (2) pare de participar de atos de governo, (3) tenha cessada sua atuação político–administrativa, pois compete aos secretários municipais, “(…) juntamente com a chefia do Executivo local, a administração e a execução de políticas públicas da municipalidade”. 6. Demonstrado que o impugnado não se desincompatibilizou de fato, pois em momento algum deixou de transitar no âmago do Poder Executivo e de atuar como integrante da administração do município sob o prisma político–administrativo do cargo de secretário municipal. Incidência do conjunto de normas composto pelo art. 1º, inc. III, al. b, n. 4, c/c o inc. V, al. b, e inc. VI, da LC n. 64/90. 7. Procedência. Indeferimento do registro.
(TRE-RS – RCand: 0600741-31.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE – RS 060074131, Relator: OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Data de Julgamento: 12/09/2022, Data de Publicação: PSESS-139, data 13/09/2022)
Do contexto fático-probatório extraído dos autos, tem-se uma aparente desincompatibilização do cargo de Secretário Municipal, operada apenas no plano jurídico. Explica-se.
Valendo-se da lição dos administrativistas, segundo a clássica divisão de agentes públicos, tem-se que os agentes políticos são aqueles que atuam no exercício da função política de Estado, que possuem cargos estruturais e inerentes à organização política e que exercem a vontade superior do Estado, sendo inconteste que os ocupantes de cargo de secretário municipal enquadram-se em tal categoria (Manual de Direito Administrativo, 06ª ed.; pág. 785. Matheus Carvalho).
Por sua vez, os servidores públicos em sentido estrito (efetivo) caracterizam-se pela relação profissional (concurso público) com a Administração Pública e estão sujeitos à hierarquia funcional instituída no órgão ou entidade ao qual estão vinculados, caracterizando-se, no geral, pelo desempenho de atividades-meio e burocráticas.
Da análise das notas de empenho juntadas, documentos públicos por natureza, verifica-se que no intervalo de 29/04 a 27/06/204 foram empenhadas 07(sete) diárias em favor do impugnado, com as seguintes finalidades (conforme descrição nas notas de empenhos):
1.duas diárias para “ … PARA TRATAR DE ASSUNTOS DE INTERESSE DESTA SECRETARIA, JUNTO A ASSESSORIA JURÍDICA E ELABORAÇÃO DE PROJETOS VERMELHA CONSULTORIA…”;
2.uma diária para “ … PARA ACOMPANHAR O PREFEITO MUNICIPAL JUNTO AO ESCRITÓRIO DE ASSESSORIA JURÍDICA”;
3.três diárias para “ … PARA ACOMPANHAR O PREFEITO MUNICIPAL JUNTO AO ESCRITÓRIO DE ASSESSORIA JURÍDICA E ASSESSORIA PLANEJAMENTO E ELABORAÇÃO DE PROJETOS”;
4.uma diária para “ … PARA PARTICIPAR DE REUNIÃO SOBRE A RELEVÂNCIA DO PAPEL DAS INSTANCIAS DE GOVERNANÇA NA POLITICA PUBLICA DE TURISMO”;
As finalidades das diárias revelam que, de forma dissimulada, o impugnado, mesmo após a sua exoneração, continuou exercendo de fato o cargo de secretário municipal, desempenhando atividades típicas do referido cargo, de natureza político-administrativa, e não de digitador, como alegado. O mero desempenho do cargo de digitador, de natureza burocrática e despida de atividades de natureza intelectual (técnica, direção, assessoramento, etc.), é manifestamente incompatível com as finalidades das diárias, não sendo necessário raciocínio intelectivo para se chegar a tal conclusão. Veja-se o entendimento do TSE em caso análogo.
“Eleições 2020 […] Desincompatibilização. Secretário municipal art. 1º, IV, a, da LC nº 64/1990. Prazo de desincompatibilização de 4 meses. Publicações em redes sociais. Reuniões interfederativas com autoridades federais e estaduais. Atividades típicas do cargo de secretário municipal. Ausência de afastamento de fato. Inelegibilidade […] 3. No caso, é incontroverso que: (a) o recorrente exerce, na Prefeitura Municipal de Munhoz de Melo/PR, o cargo público de zootecnista, de natureza técnica, tendo se afastado, oficialmente, em 15.8.2020; (b) em 7.6.2017, foi nomeado para exercer as atividades de secretário municipal da pasta de Agricultura, Pecuária e Meio ambiente e de secretário municipal da pasta de Indústria, Comércio e Serviços, tendo se afastado das funções, oficialmente, em 4.6.2020; (c) em 11.7.2020, publicou, em rede social, fotografia com o prefeito à época e com o então pré–candidato a vice–prefeito, na obra de construção do asfalto do distrito de Fernão Dias até Munhoz de Melo; (d) em 4.8.2020, publicou, em sua rede social (Facebook), foto com a seguinte legenda: “Reunião em Curitiba com o Superintendente do INCRA Robson Bastos, Deputado Nishimori e moradores da Fazenda Campo Grande, pra tentarmos resolver o problema do assentamento das 19 famílias. Excelente reunião, que DEUS abençoe, vai dar certo”; (e) recebeu diária em razão do descolamento para a cidade de Curitiba/PR realizado em 4.8.2020, cuja justificativa por ele prestada – para fins de recebimento do respectivo montante – foi a seguinte: “[…] visita à Secretária de Agricultura e Abastecimento SEAB (em audiência com a assessoria do Secretário de Estado, pleiteando recursos para o município) e no Incra para tratar de assuntos referentes ao Município de Munhoz de Mello […]”; (f) em 15.8.2020, publicou, em rede social, nova imagem da obra de construção do asfalto do distrito de Fernão Dias até Munhoz de Melo, com a seguinte legenda: “[…] o município colocando as placas de sinalização para o Distrito de Fernão Dias […]; (g) o recorrente foi eleito prefeito do Município de Munhoz de Melo/PR na eleição realizada em 15.11.2020. 4. A Corte regional, soberana na análise do acervo fático–probatório, atestou que as atribuições compreendiam a efetiva representação do Poder Executivo Municipal nas respectivas áreas designadas, cujas atividades são de natureza político–administrativa. De fato, não há como dissociar visitas a obras de construção de asfalto relacionada ao município do qual é secretário municipal, bem como participação em reunião com autoridades do Poder Executivo Federal (superintendente do Incra), do Poder Executivo Estadual (representantes da Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento) e do Poder Legislativo (deputado Nishimori) – destinadas a tratar de assentamento de “moradores da Fazenda Campo Grande” e a angariar recursos para o Município de Munhoz de Melo/PR – das atividades próprias de secretário municipal, a quem compete, juntamente com a chefia do Executivo local, a administração e a execução de políticas públicas da municipalidade. 5. Para alterar a conclusão da Corte regional acerca da correlação das atribuições das funções de secretário municipal – desempenhadas pelo recorrente – e a consequente submissão ao art. 1º, IV, a, da LC nº 64/1990 –, seria necessária incursão no acervo probatório dos autos do processo eletrônico, providência inviável na via eleita, nos termos do Enunciado nº 24 da Súmula do TSE. Precedente […]”.(Ac. de 18.12.2020 no REspEl nº 060020394, rel. Min. Mauro Campbell Marques.)( Grifo nosso)
Com o exercício de fato do cargo de secretário municipal, manteve-se o impugnado no núcleo de poder da administração pública, exercendo influência sobre a estrutura administrativa do município e perante a população local. Reforça o exposto o documento de ID 122476070, no qual foi certificado pelo servidor do Ministério Público a presença do impugnado no gabinete do prefeito no dia 09/08/2024, bem como o fato de que até referida data, uma pasta tão importante(Administração e Finanças) continua sem a nomeação formal de um secretário(a).
Na sua contestação, sobre o pagamento das diárias, cerne da celeuma, o impugnado limita-se, de forma genérica, às alegações de que o pagamento se relaciona ao desempenho do cargo de digitador, sem explicitar, no mínimo, uma fundamentação coerente para a participação de um servidor ocupante de um cargo meramente burocrático em reuniões em que são discutidas demandas de cunho político-institucional. Para fins de prova de desincompatibilização, a forma não prevalece sobre o conteúdo.
Assim, as provas que constam do processo e a ausência de comprovação pelo impugnado de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 350, CPC) são suficientes para se concluir que o impugnante não se afastou de fato do desempenho do cargo de secretário municipal, recaindo sobre ele a inelegibilidade prevista no art. 1º, VII, da Lei Complementar nº 64/90.
Diante do exposto, julgando procedente a Ação de Impugnação de Registro de Candidatura, INDEFIRO o pedido de registro de candidatura de ANTONIO ARAÚJO DOS SANTOS FILHO para concorrer ao cargo de Vereador na Eleições 2024 em Morro do Chapéu do Piauí.
Registre-se. Publique-se. Intime-se.
Esperantina, datado e assinado digitalmente.
Luciana Rocha Damasceno Cavalcante
Juíza da 41ª Zona Eleitoral
A defesa dos candidatos pretendem recorrer das decisões. Segundo os advogados estão confiantes em reformar estas decisões.
O Portal Luzilândia News disponibiliza espaço para a defesa dos candidatos acima mencionado.